Vamos
falar de Egúngún?
Ìyá
Mi Òsòròngà e a criação do manto de Egúngún!
Ìyá mi Òsòròngà:
Significa
“Minha Mãe Òsòròngà”. É um jeito carinhoso de tratar um poder muito perigoso que
substitui a palavra àjé, feiticeira. Nas Casas de Candomblés é reverenciada no
Ìpàdé de Èsù (Exú), conforme o cântico:
Apáki
yeye ‘sòròngà - Dona de asas magníficas Òsòròngà
Apáki
yeye ‘sòròngà - Dona de asas magníficas Òsòròngà
Ìyá
mó ki o má mà pani – Mãe, eu a cumprimento, não me aflija
Ìyá
mó ki o má mà soro – Mãe, eu a cumprimento, não seja cruel
Ba a
bá dé wá jú wa ni – Se você chegar junto a nós
Bò
mi o – Proteja-nos [cubra-nos]
Egúngún:
Espíritos
que se materializam sob vestes vistosas e coloridas. A palavra é traduzida para
“mascarados”, ao contrário da palavra Éégun, também usada para denomina-los que
significa “esqueleto ou osso”.
A Sociedade
Egúngún é restrita aos homens, embora mulheres tenham cargos no culto. Tanto
aonde são guardados os trajes como o bosque para oferendas são denominados
Ìgbàlè. Um Itan {mito} diz que a divindade Amaiyegún que ensinou a fazer os
trajes dos Egúngún. Os trajes não podem ser tocados quando as entidades estão
incorporadas sob eles. Daí a presença de òjè, os sacerdotes responsáveis por
essa vigilância.
Após
a criação do mundo, o Ser Supremo Nagô, Olódùmarè (Olodumaré), convocou Òsàlá
(Oxalá), Ògún (Ogum) e Odù Lógboje, conhecida como Íyá mi òsòròngà e determinou
que todos deviam ir para a Terra recém-criada.
Odù
Lógboje:
Denominação
inicial de Òsòròngà, também chamada Ìyá nlá, a Grande Mãe. Representa o
princípio da Mãe Universal e é confundida com Odùa, forma reduzida de Odùdúwà.
Integra o conjunto de Òrìsà (Orixás) primordiais que viveram diretamente com Olódùmarè.
Relaciona-se com a fertilidade feminina pelo poder de controlar o sangue das
regras das mulheres. Òsun (Oxum) é a herdeira do seu poder.
Na
Terra recém-criada, Ogum foi na frente abrindo os caminhos, Oxalá com a missão
de realizar todas as obras necessárias para o desenvolvimento da Terra. Ìya mi
seguiu logo atrás e retornou a Olodumaré para se queixar por não ter função
definida: “Os dois primeiros receberam o poder da guerra e da criação, e eu não
recebi nada”.
Olodumaré
lhe disse: “Você é a única mulher do grupo, o que a torna a Mãe Universal: por
isso, será chamada de Ìyá Wón, a Mãe de Todos para a eternidade. Você dará
continuidade à criação do novo mundo. Os homens nada poderão fazer na sua
ausência”. Lhe deu uma cabaça com o poder dos pássaros, tornando-a Eléiye, a
Proprietária dos Pássaros e lhe perguntou: “Como você vai utilizar seus
pássaros e as forças que eles lhe darão?” Ìyá mi respondeu que daria proteção a
quem lhe viesse pedir orientações e filhos às mães que lhe fizessem oferendas.
Mas, se essas pessoas ficassem impertinentes e mal agradecidas, ela tomaria
tudo de volta e ainda as perseguia. Olodumaré disse: “Está bem, mas utilize com
calma seu poder, pois será muito grande. Se usar de violência, eu o retirarei”,
e repetiu: “Você será Ìyá Wón, a mãe de todos os homens. Será a você que eles
deverão procurar. Sem sua presença, nada será realizado.”
Eléiye:
A
dono do poder dos pássaros. É a forma que as feiticeiras assumem em suas
atividades malignas e o nome de diversos pássaros: Àgbìgbò, Atioro, Èlùlú e
Èhurù. Pássaros que são acomodados dentro de uma cabaça. Quando uma missão é
necessária, a cabaça é aberta, como diz o canto do Odù Ìrète Méjì:
Nígbatí
nwon ba fé rán eléiye yen n’isé
Quando
elas querem enviar um pássaro em missão
Nwon
o si igbá yen s’ókè
Abrem
a cabaça
Eléiye
yen yio fo jade ninú igbá yen
O pássaro
voa para fora da cabaça
Yio lo
sé’sé ti nwon bá rán na
E vai
cumprir a missão para onde for enviado
Pelo
poder dado por Olodumaré, Ìyá mi passou a ter acesso a todos os lugares mais
secretos do culto aos Orixás, Égúngún e Orò. Não havia nenhum lugar que Ìyá mi
não entrasse. Era tal seu poder que até se negava a fazer oferendas para se manter
forte e poderosa.
Orò:
Um
conjunto de Sociedades Religiosas como Egúngún e Agemo, onde mulheres não
desfrutam de direitos iguais em relação aos homens. Entretanto, na Sociedade
Gèlédé o controle é exclusivo das mulheres, embora sejam os homens que usam as
máscaras rituais.
Oxalá,
que a tudo assistia, ficou contrariado. Foi consultar Orumilá para saber seu presságio,
pois as coisas não estavam ocorrendo como deviam. A mensagem enviada por Olodumaré
dizia o seguinte: “Ìyá mi está exagerando e recusa-se a fazer oferendas,
esquecendo-se do meu conselho de agir com calma e prudência. A você, Oxalá, eu
entreguei o mundo, e ninguém poderá tirá-lo de suas mãos.” Oxalá informou que
Ìyá mi ia a lugares em que ele nem ousava entrar, como a Floresta de Egúngún e
a de Orò, observando tudo que ali era feito. Olodumaré o acalmou: “O mundo
continuará sendo seu, mas você deverá ter paciência porque Ìyá mi irá se
exceder e, então, ela se tornará sua criada.” E determinou a Oxalá que fizesse
oferendas de ìgbín, o caramujo, e de búzios, sendo-lhe dada uma vara de madeira
denominada Ìyá mi ou na.
Ìgbín:
Um
tipo de caramujo comestível de extrema importância no culto de Oxalá. Simboliza
a docilidade, tranquilidade e paz. Oferecido nos momentos em que a paz é necessária.
O líquido extraído do seu interior é denominado omi èrò, aquilo que amolece e
acalma.
Depois
de um tempo, Ìyá mi encontou Oxalá e o convidou para morar com ela. Oxalá
aceitou, e lá começou a preparar ìgbín para comer e ofereceu a Ìyá mi que
aceitou dizendo nunca ter comido nada delicioso. Depois, ofereceu a água do
ìgbín dentro de uma cabaça. Ìyá mi passou a se sentir mais calma e de bom
humor. E falou: “Todas as coisas que eu faça não posso lhe ocultar, já que
estamos morando juntos.” Oxalá concordou e Ìyá mi lhe mostrou o segredo do
manto de Egúngún. Foram até a Floresta e, lá, Ìyá mi vestiu o manto, porém não
sabia como se imitava o som da voz dos Egúngún. Somente sabia se cobrir com o
manto e cantar os oriki. Depois voltaram para casa.
Mais
tarde, Oxalá voltou para a Floresta dos Egúngún, no lugar onde estava o manto.
Ele o vestiu e antes fez algumas modificações. Acrescentou uma tela na altura
do rosto, antes quando as mulheres usavam o manto não havia tela. Vestido com
manto dos Egúngún, Oxalá pegou o ìsan, a vara que Olodumaré lhe dará quando o
ebo (oferenda) foi feito. Saiu da floresta arrastando a vara no chão e
reproduzindo a verdadeira voz dos Egúngún, foi até aonde estava todas as
pessoas, que assustadas, o reverenciaram como um verdadeiro Egúngún.
Estando
por perto, Ìyá mi viu aquele Egúngún com o ìsan, ficou assustada e passou a
observar o Egúngún circular por toda a cidade, seguindo-o de longe. Verificou
que o manto era o seu, mas não sabia quem estava dentro. Mas desconfiou, por
não ver Oxalá. Enviou seu pássaro, Èhurù, para descobrir quem estava por baixo
do manto. O pássaro pousou no ombro do Egúngún e lá permaneceu.
Oxalá,
depois de fazer o que pretendia com o manto, voltou para a Floresta, se despiu
e voltou a se vestir com suas vestes brancas. O pássaro Èhurù retornou à sua
dona e relatou tudo o que viu.
Oxalá
entrou em casa e foi cumprimentado por Ìyá mi, que perguntou de onde ele estava
vindo. “De fora”, disse ele, jogando no chão todos os presentes que havia
recebido pelo povo ao Egúgún. Ìyá mi ironizou: “Muito bem, então era o meu
manto que você estava vestido. Ele fica melhor em você do que em mim. Olodumaré
deu primeiramente a inteligência e o poder de Eléiye à mulher, porém, com sua
astúcia, o homem tomou o poder das mãos das mulheres.”
A
partir de então, Ìyá mi concedeu o poder dos Egúngún aos homens. Nenhuma
mulher, nunca mais, ousou entrar no manto por causa de Oxalá. Mas a amizade de
Egúngún e Eléiye se perpetuou, pois aonde estava um, estava o outro. Nenhuma mulher
poderá vestir o manto, mas poderá dançar e ir ao seu encontro. Só não podem
entrar no local de culto.
Quanto
à mulher, ninguém, nem crianças pequenas, nem velhos, poderão lhe faltar o
respeito. Todas as pessoas nascerão da mulher, e se não forem ajudadas por ela,
nada conseguirão. A mulher terá mais poder na Terra, pois colocou todos os
seres humanos no mundo.
Conclusão:
É
por isso que Oxalá canta no Odù Òsá Méjì, saudando todas as mulheres:
Ekúnlè
o, ekúnlè f’óbìnrin o
Ajoelhem-se,
ajoelhem-se para as mulheres
E
obìnrin l’ó bi wa, k’awa to d’enia
Ela
colocou vocês no mundo, somos seres humanos
Ogbón
àiyé t’obìnrin ni, ekúnlè f’óbìnrin o
A
mulher é a inteligência da Terra, ajoelhem-se
E
obìnrin l’ó bi wa o, k’awà to d’enia
Ela
colocou vocês no mundo, somos seres humanos.
Ìsan:
Vara
feita de um galho de árvore denominada Àtòri (Glyphaea lateriflora) ou feita de
nervuras da folha Igi òpe (Elacis guineenses), o dendezeiro. São os òjè
(sacerdotes) que utilizam do ìsan para invocar e conduzir os Egúngún, além de
impedir que as pessoas toquem em seus tecidos.
Aso
Egúngún:
É o
manto que cobre os Egúngún. Extremamente coloridos e algumas partes possuem
nomes específicos: Abala – longas tiras coloridas; Bànté – espécie de avental;
Kàfó – rede colocada na altura do rosto; e possuem símbolos e instrumentos que
os identificam a qual Orixá estão relacionados.
Séègì:
A
voz dos Egúngún. Voz rouca e profunda, não comum aos humanos, e semelhante a
voz de um tipo de macaco africano – Ìjímerè.
Òtò
ni égún, òtò ni òrisà:
Uma expressão
que significa Égún, diferente de Orixá, e que reflete a distinção de ambos nos
ritos.
Egúngún
ni a nse - É egúngún que nós fazemos
Àwa
ò se òósà – Não fazemos Orixá
Kí
aláso funfun – Que o dono das roupas brancas
Kúrò
ni agbo wa – Afaste-se de nosso círculo
Éégun
e Òrìsà (Orixá):
Os
Ééguns estão ligado9s a determinados Orixás e, quando se apresentam, usam
símbolos e cores que os identificam:
Olúkòtún
– Oxalá
Agbóulá
– Xangô
Àjímúdà
– Yansã
Omitodò
– Yemanjá
Atiléwa
– Ogum
Bàbá
Aro – Oxóssi
Bàbá
Ayó – Oxum
Obalójó
– Omolú
Araigbó
– Ossanhe
Autor:
Eosphorus Pluto Eleutherios
Blog:
Bruxaria Sem Dogmas
Referência:
Mitos Yorubás (o outro lado do conhecimento). Autor: José Beniste.
José
Beniste é escritor, historiador, pesquisador de Cultura Afro-Brasileira, é
integrante de movimentos que visam à restauração da dignidade religiosa do
afrodescendente. Iniciado pela Sociedade Axé Opô Afonjá, em 1984, é diretor do
Curso Brasil-Nigéria, fundado em 1982. Ministra aulas de Língua Yorubá.
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